"Insensato Coração": Norma sai de cena e entra para a história

Ela vivia sua vidinha simples e insípida em Florianópolis até o dia em que um homem aparece para, à primeira vista, lhe fazer feliz. Protagonista de "Insensato Coração", Norma (Gloria Pires) redescobre o amor nos braços de Léo (Gabriel Braga Nunes), que diz se chamar Armando - nome bem sugestivo, aliás. O vilão aproxima-se da enfermeira na cantina de um hospital, após saber que seu patrão guarda em casa a exata quantia de R$ 80 mil. Sempre envolvido em negócios sujos, Léo pretende roubar a grana para investir em máquinas caça-níqueis.

Após encher os ouvidos de Norma de palavras doces, ganhando totalmente sua confiança, Léo põe em prática seu ardiloso plano: roubar o dinheiro do patrão da coitada. Quando ela tenta entender o que aconteceu, o bandido mostra sua verdadeira face e lhe diz meia-dúzia de desaforos. "Se olha no espelho. Você acreditou mesmo que eu me apaixonei desesperadamente por você? Amor à primeira vista? Olha, burrice tem limite!", despeja. Em seguida, fuge sem deixar pistas. Norma, sem poder provar a existência do tal Armando, acaba pagando pelo roubo.

A auxiliar de enfermagem é condenada a seis de prisão, embora não chegue a cumprir tudo isso. Nutrindo um desejo irrefreável de vingança contra seu algoz, Norma se vê capaz de tirar a vida de uma detenta para colocar as mãos em seu dinheiro. Contemplada com a liberdade condicional, ela deixa o presídio e dá início a sua desforra: destruir Armando. Pouco a pouco, descobre o nome verdadeiro do bandido, o reencontra, cataloga provas de seus crimes e, enfim, consegue engrenar sua ansiada vingança. Antes, dá um jeito de casar com um milionário. Viúva e podre de rica, Norma trata de cortar as asas de Léo e, ameaçando-o, faz dele seu capacho. Com medo de mofar na cadeia, o vilão não vê outra saída senão ceder aos caprichos da nova rica.

A partir daí, Léo sofre numerosas provações: dorme em um quartinho nos fundos que mais parece um canil; come restos de comida no chão; apanha; fica banguela e vira alvo de chacota; engraxa os sapatos do empregado, de joelhos; chafurda no lixo à procura de uma aliança que nunca esteve ali... Norma não poupa o lombo do sacripanta. Léo, claro, nunca perde a esperança de reconquistá-la e reverter o jogo. Sempre confiante de que todo o sofrimento que está passando será recompensado. Está certo.

Mesmo relutando, Norma não consegue resistir aos encantos do copeiro por muito tempo. Admite que, apesar de todo o ódio que alimenta, sempre o amou. A partir de então, a viúva milionária decide seguir a voz de seu coração e dá uma nova chance à Léo. Ressabiada, mas dá. Ironicamente, passa de maior inimiga a principal defensora do mau-caráter. Compra briga com todo mundo e paga um advogado para tirá-lo da cadeia, quando preso responsável pela queda de um avião. O título da novela é então justificado.

É aí que a história do golpe sofrido por ela no passado vem à tona. Todos tomam conhecimento de que a viúva é apenas uma vítima de Léo e, diante da sua apatia, passam a lembrá-la do ser perverso que ele é. Em vão. Norma só acorda novamente após descobrir que não foi a única presa de Léo. Então, arma uma cilada e constata que ele continua o mesmo facínora de sempre. Ferida por dentro novamente, ela decide retomar seu plano de vingança, entregando todas as provas que tem contra ele para a Justiça. Tarde demais. Alguém trata de abreviar a vida da infeliz. Norma morre com três tiros no peito. O insensato coração para de bater. Nada mais conveniente.

Assim, "Insensato Coração" tira de cena sua protagonista antes da hora combinada (expediente praticamente inédito) e fixa mais um "quem matou?" no hall de chavões da teledramaturgia nacional. Gilberto Braga, Ricardo Linhares e, sobretudo, Gloria Pires merecem nossos aplausos por nos brindarem com essa inesquecível personagem - composição complexa e atuação magnífica. Independente de qualquer avaliação da novela, Norma entra para a galeria de grandes mulheres da nossa ficção. Mas que ninguém cometa o erro de epigrafá-la como vilã, por favor.