Especial: "O Dono do Mundo" (1991)

Hoje, vamos recordar um folhetim que, embora não esteja entre os mais célebres do autor Gilberto Braga, é lembrado sempre com muito carinho pelos amantes da teledramaturgia nacional. Vamos voltar ao ano de 1991 e solenizar a novela "O Dono do Mundo", que este ano comemora 20 anos de estreia.

A história, que se passa no Rio de Janeiro, nos apresenta como protagonista o cirurgião plástico Felipe Barreto (Antonio Fagundes), um homem altivo e bem-sucedido profissionalmente. Casado por mero interesse com Stela (Gloria Pires), filha do empresário Herculano Maciel (Stênio Garcia), Felipe demonstra toda sua amoralidade ao conhecer Márcia (Malu Mader), uma pobre e ingênua professora que está noiva de Walter (Tadeu Aguiar), funcionário de sua clínica. Encantado desde o primeiro momento em que a conheceu, o cirurgião fica ainda mais obcecado pela moça quando descobre que ela é virgem. No dia do casamento de Márcia e Walter, Felipe aposta com o amigo Júlio (Daniel Dantas) que consegue levar a noiva para cama antes do próprio noivo. Aposta feita, o pilantra trata logo de pôr em prática o seu plano egoísta, oferecendo aos recém-casados uma lua-de-mel no Canadá, para onde ele também está partindo.

Na noite de núpcias do jovem casal, Felipe dá um jeito de tirar Walter do hotel e seduz Márcia, conseguindo consumar seu ardiloso esquema e saciando seu desejo por ela. Mas as consequências dessa investida acabam sendo trágicas. Walter flagra os amantes na cama e, desnorteado, sai de carro e sofre um acidente fatal. A morte dele recai sobre as costas de Márcia, que é vista com desprezo por todos. Logo ela descobre que está grávida e, ao procurar por Felipe, fica sabendo que o que aconteceu naquela noite não passou de uma aposta barata, sendo ainda aconselhada por ele a fazer um aborto. A professora não segue a recomendação, mas acaba perdendo o bebê um tempo depois. Numa das cenas mais marcantes da trama, Márcia, possessa, vai a clínica de Felipe e lhe corta o rosto com um bisturi.

Arrasada com todos os acontecimentos e disposta a se vingar de seu algoz, Márcia encontra na cafetina Olga Portela (Fernanda Montenegro) o seu maior amparo. Com o auxílio dela, que conhece muito bem os pobres do passado de Felipe, a professora consegue dar início ao seu plano de vingança e coloca o cirurgião safado na cadeia. Só que, a essa altura, ela já está apaixonada pelo cretino.

Para driblar a baixa audiência, Gilberto Braga foi convencido a mudar o perfil de Felipe Barreto, pois a canalhice do personagem não agradava ao público. Assim, o cirurgião acabou ganhando cores de mocinho. A personagem de Malu Mader, excessivamente ingênua, também sofreu rejeição e teve que ser reformulada. A cena do bisturi marcou essa mudança de personalidade.

Ao mesmo tempo em que a audiência repugnava os protagonistas de Fagundes e Malu, adorava o casal Thaís (Letícia Sabatella) e Guilherme (Ângelo Antônio), o Beija-Flor. Ela, uma garota que vê na prostituição uma alternativa para ascender socialmente. Ele, um marginal que, para agradar de vez o espectador, se torna um homem de bem. O romance deu tão certo que acabou ultrapassando a barreira da ficção. Letícia e Ângelo se casaram logo após a novela e viveram juntos até 2003.

Para inflar os índices de audiência de "O Dono do Mundo", Gilberto contou com a honrosa colaboração de Silvio de Abreu, a quem tinha dado uma mão em "Rainha da Sucata" no ano anterior. Juntos, os autores conseguiram imprimir maior agilidade à trama, delinear melhor os personagens e, consequentemente, cativar o público. O fato é que a novela, além de todos os problemas internos, vinha sofrendo ao dividir a atenção da audiência com a mexicana "Carrossel" -- exibida com grande sucesso pelo SBT --, que também fisgou uma respeitável porcentagem do "Jornal Nacional". O embate entre as duas emissoras no horário lembrou a briga que a Globo travou com a Rede Manchete em 1990, quando o canal paulista emplacou o maior êxito de sua história: "Pantanal".

Com a reformulação quase total, outros personagens e núcleos passaram a ganhar destaque em "O Dono do Mundo", como a divertida socialite Karen, de Maria Padilha; o romance entre Stela e Rodolfo (Kadu Moliterno, que Gilberto dizia ser o verdadeiro mocinho da história); o núcleo do subúrbio; além dos já citados Thaís e Beija-Flor, que conquistaram o carinho do público ao som de "Codinome Beija-Flor", de Cazuza, na voz de Luiz Melodia.

Mas quem mais brilhou nessa nova fase foi Nathalia Timberg. A sua amarga Constância Eugênia, mãe do personagem de Fagundes, dizia os maiores impropérios, se tornando assim a grande vilã da novela - mais uma na galeria da veterana atriz. Bom, dizer que Nathalia foi quem mais brilhou em "O Dono do Mundo" talvez não seja a afirmação mais correta, pois Fernanda Montenegro, que dispensa adjetivos, também estava ali, na pele da já mencionada Olga Portela, uma cafetina impagável. E o melhor: as duas consagradas atrizes eram ferrenhas inimigas na trama. Constância odiava Olga por ela ter sido amante de seu marido, 
Altair (Paulo Goulart). No fim, é revelado que a cafetina é a verdadeira mãe de Felipe. O cirurgião, então, deixa de bancar as mordomias de Constância, que é obrigada a mudar do luxuoso apartamento onde mora e a ver seus móveis transportados por uma caminhonete chinfrim.

O grande barato de "O Dono do Mundo" veio no último capítulo. Gilberto Braga "sambou" na cara do público que havia rejeitado a sua sinopse, ao revelar que Felipe Barreto jamais mudou sua personalidade vil e mesquinha. O personagem enganou a audiência, assim como fez com Márcia na primeira semana do folhetim. Antônio Fagundes, que sempre fez heróis na TV, construiu um vilão de primeira grandeza. O Troféu Impresa daquele ano está em sua estante.

Em entrevista, Gilberto Braga já disse que se orgulha muito da premissa de "O Dono do Mundo", porém, admite que pesou a mão na crítica social. Talvez sem a intenção, a novela enaltecia a elite e pintava a população pobre como meros infelizes, criando dessa forma um olhar pessimista para a realidade brasileira naquele momento. Isso, sobretudo, é apontado como o maior equívoco da produção. No cinema, "O Dono do Mundo" certamente teria sido um sucesso de bilheteria.

E +
ABERTURA: "O DONO DO MUNDO"

 Estreia: 20 de maio de 1991
 Fim: 04 de janeiro de 1992
 Duração: 197 capítulos
 Horário: 20h30
 Emissora: Globo
 Autor: Gilberto Braga
 Colaboração: Leonor Bassères, Ângela Carneiro, Sérgio Marques e Ricardo Linhares
 Direção: Dennis Carvalho, Ricardo Waddington e Mauro Mendonça Filho
 Direção Geral: Dennis Carvalho

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